Alunos X Instituições de Ensino
Não são poucos os problemas e dúvidas existentes sobre a prestação de Serviços Educacionais de Ensino Superior em Instituições Particulares e os direitos dos alunos inadimplentes.
Para que tenhamos uma idéia deste importante mercado, atualmente existem cerca de 3,9 milhões de pessoas matriculadas no ensino superior, sendo que as instituições privadas de ensino respondem por aproximadamente 71% das vagas oferecidas nas Universidades. Além disso, do total de cursos existentes no País (16.453), 65,6%, ou seja, 10.791, estão no setor privado e apenas 5.662 (34,4%) em instituições públicas. Em relação ao número de instituições de educação superior, a concentração é ainda maior no setor privado. Das 1.859 instituições registradas em 2003, apenas 207 são públicas, representando 11,1% e 1.652 são privadas, representando 88,9% do total de instituições existentes, conforme o Censo da Educação Superior divulgado pelo INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, em 13 de outubro do corrente ano.
Diante deste quadro, um dos temas que sempre suscita dúvidas e conflito está na forma de remuneração das Instituições de Ensino Superior (IES) e os direitos garantidos aos alunos que se tornam inadimplentes.
Como é de senso comum, o ingresso no Ensino Superior requer um planejamento adequado e cuidadoso, devendo-se reservar tempo hábil e situação financeira que viabilize o ingresso numa Instituição Privada de Ensino. O aluno também pode verificar a possibilidade de se inscrever nos inúmeros programas governamentais de bolsa de estudos atualmente existentes como o FIES, Bolsa família e o Prouni, ou mesmo recorrer a programas de bolsa oferecidos por inúmeras IES. Temerária, senão imprudente, seria qualquer decisão de um potencial aluno sem a necessária ponderação.
Mas ninguém está livre de se ver em uma situação econômica difícil, que venha a inviabilizar o pagamento de um curso Universitário, muitas vezes um sonho de toda uma família e sincera expectativa de mudança de vida. No entanto, os alunos que se encontram nesta difícil situação não encontraram na lei a obrigatoriedade de renovação de suas matrículas caso esteja inadimplentes (artigo 5º da Lei 9.870/99). O único comportamento a que estão obrigadas as IES é disponibilizar ao consumidor todos os seus documentos acadêmicos (histórico escolar,etc), não podendo impor qualquer sanção pedagógica como não confecção de provas, exclusão em lista de presença, etc.
Em situações como esta, um correto planejamento e administração da inadimplência permite que os interesses de uma IES sejam atingidos sem desrespeitar os basilares direitos garantidos pelo Código de Defesa do Consumidor - CDC. Temos visto que profissionais especializados na área de gestão de recebíveis em atraso têm criado condições para harmonizar os interesses das IES e dos alunos inadimplentes, tudo em sintonia com os princípios constantes no artigo 4º e 6º do Codecon, evitando questionamentos judiciais e pesadas sanções aplicadas pelos órgãos Administrativos de Defesa do Consumidor, predominantemente os PROCONS.
Por isso, não se pode esquecer que os contratos de ensino além de baseado na equidade dos direitos e obrigações das partes contratantes tem também função social e estão submetidos a uma boa-fé objetiva, que impõe às partes um dever anexo de cuidado e respeito para que o contrato inicialmente ajustado consiga atender às expectativas de ambas as partes. Desta forma, uma correta negociação, menos onerosas aos estudantes e que, ao mesmo tempo, permita a emissão de títulos com maior poder de liquidez, pode resgatar um sonho de vida por ora obstado e atender à todas as leis que regulam o setor, sobretudo o Codecon.
Devemos acreditar que cada consumidor tem nome e dignidade a zelar e que eventual situação de inadimplência não pode lhe ser apontada como a espada sobre cabeça de Dâmocles. O que pretendemos é ressaltar que a melhor saída está em uma negociação justa, sem excesso de garantias ou abusividades outras, de forma que uma correta administração da inadimplência, garanta os direitos constitucionais dos consumidores em perfeita harmonia com as necessidades da livre iniciativa.
Vitor Morais de Andrade - Advogado, Professor de Direito do Consumidor da graduação e pós-graduação LatoSensu da PUC/SP.